março de 2019
“Todo mundo deve inventar alguma coisa, a criatividade reúne em si várias funções psicológicas importantes para a reestruturação da psique. O que cura, fundamentalmente é o estímulo à criatividade. Ela é indestrutível. A criatividade está em toda parte” (Nise da Silveira)
A necessidade de expressão é inerente ao homem e remonta aos tempos dos primórdios. No entanto, seu potencial curativo tem sido cada vez mais discutido e difundido na contemporaneidade.
No início do século XX, Sigmund Freud, médico neurologista criador da psicanálise, despertou interesse pela Arte ao observar que o inconsciente se expressa através de imagens, portanto, chegando aos seus significados de forma mais direta que o verbal. Ainda no século XX, seu discípulo Carl Gustav Jung – psiquiatra suíço que fundou a psicologia analítica – desenvolve a teoria dos arquétipos, onde fala das imagens primordiais contidas no inconsciente coletivo que surgem nos mitos e lendas de toda a humanidade. Percebe também a relação do desenho de seus pacientes com os sonhos, estabelecendo uma relação entre o inconsciente do indivíduo e a expressão artística. Dessa forma, a arte começa a ser objeto de estudo e instrumento terapêutico para desvendar a psique humana.
A Arteterapia utiliza diversas técnicas arteterapêuticas que buscam nas artes plásticas, na dança, na música, na literatura, etc., um meio facilitador ao acesso do universo simbólico do sujeito.
É através do símbolo que o sujeito entra em contato com níveis mais profundos e inconscientes da psique, podendo descobrir conteúdos que o ajudam a crescer e se desenvolver.
Para Urrutigaray (2008):
… aquele que tem acesso à arte ou ao “fazer artístico” está tendo a oportunidade de desenvolver ou de configurar habilidades, as quais são, por sua vez, reveladoras da estrutura intelectiva ou cognitiva de quem as realiza, assim como também de seus sentimentos e valores ideais. Pois uma imagem projetada no papel ou numa escultura, ou num movimento do corpo, reflete a maneira pessoal de cada um relacionar-se, posicionar-se, de estar no mundo. (URRUTIGARAY, 2008, p. 29)
Como intervir para amenizar os impactos de uma infância marcada por rupturas e feridas emocionais?
Se a história pessoal de cada criança não pode ser reescrita, pode ao menos ter experiências ressignificadas, ajudando-as a lidar de forma resiliente com as emoções.
Achamos na arte uma ferramenta capaz de ajudar as crianças na elaboração de seus medos e angústias, abrindo caminho para uma comunicação possível, em alternativa a comunicação verbal e direta onde muitas vezes não é possível chegar.
No trabalho com crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social, a Arte recupera a autoestima, pois tendem a desacreditar de suas potencialidades. Uma característica muito frequente em quem sofreu rupturas e se encontra às margens da sociedade. Através das práticas arteterapêuticas, é possível construir uma imagem mais positiva de si mesmo, e fortalecer a estrutura emocional, que no geral, apresenta-se muito frágil.
Outro ganho evidente no trabalho com a Arte é a capacidade de expressar conflitos através da construção artística, seja através da narrativa de um conto, de um desenho ou pintura, uma modelagem, entre tantas outras possibilidades que a Arte disponibiliza no setting terapêutico.
A arte sempre marcou o trajeto evolutivo da humanidade por ser um meio pelo qual o ser humano expressa sua alma. Sendo assim, as ferramentas expressivas da arte podem ser utilizadas como recurso terapêutico. No contexto em questão, o uso da arte na comunicação com as crianças é significativo sobretudo porque o universo simbólico delas é extremamente rico e deve ser instigado na expressão e potencial criativo, ajudando-as a se estruturarem como adultos psicologicamente e emocionalmente saudáveis.
¹ http://institutofreedom.com.br/blog/nise-da-silveira-o-olhar-com-o-coracao
Tatiane Terres é arteterapeuta, e atua na Casa Lar Luz do Caminho em Florianópolis.